No dia 12 de março comemora-se o dia do bibliotecário. Além de organizar, catalogar, classificar acervos e planejar atividades culturais e clubes de leitura, este profissional pode ajudar a transformar vidas.
Bibliotecas públicas são lugares protegidos onde as portas estão sempre abertas para quem quiser entrar. Entre as paredes seguras e os livros do espaço, está o olhar observador e sensível e as ações gentis dos bibliotecários, capazes de ajudar a mudar a condição social de alguns de seus frequentadores. Todos os dias, nas bibliotecas públicas de São Paulo, acontecem algumas estórias, como as que se seguem, que revelam o papel transformador desse profissional.
Dos cinco aos onze anos de idade, Luciene Vignoli Muller morou nas ruas da zona norte de São Paulo. À noite, pulava os muros da biblioteca pública Álvares de Azevedo, no bairro da Vila Maria, e buscava proteção para dormir nos jardins do edifício. Ali, passava os dias lendo e, graças, também, ao olhar cuidadoso da bibliotecária, dona Ursulina, Luciene conseguiu mudar a sua realidade. Hoje, ela é casada, tem uma filha, é proprietária de uma editora, palestrante e ativista em defesa dos direitos das crianças. No livro Colo Invisível contou um pouco da sua trajetória.
Para chegar à biblioteca Mário de Andrade, no centro da cidade, Pedro (nome fictício) atravessa a cidade, quase todos os dias. Lá, passa algumas horas da tarde assistindo a filmes. Como ficou suspenso, depois de quebrar um equipamento, deixou de ir à biblioteca por um tempo. Um dia, reapareceu e dormiu, com a cabeça apoiada em uma das mesas. Quando acordou, deparou-se com o livro Capitães de Areia, com um bilhetinho, deixado pela bibliotecária Aline Barbosa Petelin: “Pedro, eu fiquei muito feliz que você voltou! Enquanto você ainda não puder usar o equipamento, talvez, goste de ler este livro”. Em uma tarde, Pedro leu quase todo o romance de Jorge Amado.
Na biblioteca Menotti Del Picchia, no Bairro do Limão, dois garotos procuraram a bibliotecária Melina Isabel Campanini, com a proposta de formar um time de futebol. Juntamente com Tharsila Mira, educadora física e voluntária da biblioteca, Melina organizou e ajudou a vender rifas para os meninos levantarem verbas para comprar os uniformes. As duas estão cuidando para que o time se concretize. Nem só de livros vive uma bibliotecária pública!
Emília Camargo, da biblioteca do CEU Feitiço da Vila, na Chácara Santa Maria, compadece-se com a menininha calçando tênis, cujas extremidades foram cortadas pela mãe, para que os pés muito crescidos caibam no calçado. Assim, a filha pôde participar do passeio organizado pela biblioteca.
Um grupo de mulheres costumava se reunir com uma psicóloga, para cuidar da saúde mental. Até que a bibliotecária Charlene Lemos, da Raul Bopp, que fica dentro do Parque Aclimação, convidou o grupo para se encontrar na biblioteca, para ler e bordar as suas estórias. Agora, todas as sextas-feiras, essas mulheres ressignificam as suas dores, a partir da vivência coletiva.
Uma mãe com duas filhas, moradoras em um albergue, sempre apareciam na biblioteca Hans Christian Andersen, no Tatuapé. A mãe lia os jornais, adormecia e as meninas ficavam andando pela biblioteca, mexendo nos equipamentos, desligando as luzes e os computadores. Com muito cuidado e carinho, a equipe comandada pela bibliotecária Elisangela Alves Silva, foi revertendo esse comportamento. Foram incluindo as meninas para participar das atividades, como nos grupos de contação de estórias e para ajudar na separação dos gibis. Algum tempo depois, durante uma ação da biblioteca em uma escola vizinha, Elisangela surpreendeu-se ao encontrar as meninas, vestidas de uniforme escolar, mais dóceis, prestativas, educadas e cumprimentado a todos. Elisangela soube que a mãe (que conseguiu um emprego de faxineira) sempre se referia à biblioteca com extremo carinho. Tinha sido o único lugar de onde não tinham sido expulsas.
Essas profissionais sofrem por seus frequentadores, vibram com as suas conquistas, apontam soluções, acolhem e, ainda, sugerem livros para iluminar os caminhos. Parabéns, bibliotecários!
Texto: Sandra Nedopetalski, jornalista